Coamo Agroindustrial Cooperativa | Edição 511 | Março de 2021 | Campo Mourão - Paraná

ENTREVISTA

“Cooperativas são centros de inteligência e desenvolvimento para os cooperados, e indutoras de crescimento nas comunidades”

Tânia Regina Zanella é graduada em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí (Univali), com especialização em Direito e Gestão dos Serviços Sociais Autônomos pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e pós-graduada em Direito Processual Civil, Direito Civil e Direito Público. Desde 2011 é gerente geral da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB). Antes de 2008 a 2011: Analista Parlamentar e Gerente de Relações Institucionais: Organização das Cooperativas Brasileiras – OCB. Foi eleita recentemente vice-presidente do Instituto PensarAgro (IPA), com foco na defesa das cooperativas agropecuárias e das produtoras rurais do país. Antes da OCB, Tânia de 2000 a 2002 foi assessora Especial da Procuradoria Geral do Ministério Público do Estado de Santa Catarina; de 2002 a 2003, assessora Jurídica da Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina (Alesc) e de 2003 a 2007, assessora Parlamentar do deputado Federal Odacir Zonta na Câmara dos Deputados.

Tânia Zanella assumiu a gerência Geral da OCB, em 2012, sendo a primeira mulher a assumir o cargo. "Entre as minhas diversas funções, tenho a atribuição de recepcionar as demandas das unidades estaduais e, também, das cooperativas. Em seguida, traço junto com nossas equipes uma estratégia de atuação junto aos Três Poderes", diz. Recentemente, ela foi eleita vice-presidente do Instituto PensarAgro (IPA), onde atua pela defesa das cooperativas agropecuárias e das produtoras rurais do país. "É uma trajetória onde conquistei cada passo com muito trabalho, aprendizado contínuo e paixão. Sou grata por liderar uma equipe que me inspira e por atuar por uma causa tão nobre quanto o cooperativismo", comenta.

Confira a entrevista completa com Tânia Zanella, uma homenagem da Revista Coamo às mulheres, que neste mês de março celebraram o seu dia.



RC: Dia 8 de março é comemorado o Dia Internacional da Mulher. O que deve ser celebrado?

Tânia: O Dia Internacional da Mulher, mais do que comemorado, precisa ser um momento de reflexão sobre como podemos trabalhar em conjunto para que as mulheres possam ocupar mais espaços de liderança. Não é uma luta entre os sexos e nem se trata de tirar os homens do controle. É um compartilhamento, uma cooperação para a construção de um mundo com cada vez mais igualdade e inclusão. Já tivemos muitos avanços ao longo das décadas e hoje não se questiona uma mulher que vez mais igualdade e inclusão. Já tivemos muitos avanços ao longo das décadas e hoje não se questiona uma mulher que um absurdo ou uma exceção. Mas ainda podemos avançar. Como mulher, eu também tive muitos desafios para superar, mas, também, ao longo do caminho encontrei homens que não tentaram impedir o meu protagonismo. Por isso, entendo que é importante que os homens assumam sua responsabilidade em identificar se o ambiente de negócios onde estão, de forma consciente ou não, desestimula o protagonismo de mulheres.



RC: Como analisa a ocupação da mulher no cooperativismo? Quantas mulheres atuam no sistema?

Tânia: Olha, em termos percentuais vemos que tem havido um crescimento na participação feminina – mas ainda podemos avançar. Segundo o Anuário do Cooperativismo Brasileiro, da OCB, em 2019, 38% do quadro social era composto por mulheres. Esse número cresceu em relação a 2018, quando o percentual era 36%. Por outro lado, em 2019, apenas 17% dos cargos de presidência ou vice-presidência das cooperativas eram ocupados por mulheres. Durante o 14º Congresso Brasileiro do Cooperativismo, Roberto Rodrigues lançou um desafio: que cada cooperativa tivesse ao menos um jovem e uma mulher em seu Conselho de Administração. E por que não? Concordo que essa seja uma ótima maneira de contribuir com uma maior igualdade de gênero e oportunidades, além de trazer benefícios diretos às cooperativas. Estudo de 2018, da consultoria McKinsey, afirma que organizações com mais diversidade (gênero, cultural e étnica) são 43% mais propensas a terem melhores resultados econômicos. Fica o desafio!



RC: Muito se fala do papel multifuncional da mulher, além de casa e da porteira do agronegócio. O que pensa a respeito?

Tânia: As mulheres são multifuncionais, sim. Isso é fato. A questão aqui é que essa qualidade não pode se transformar em um fardo. A mulher não pode sozinha estar a cargo da sua casa e filhos e além disso buscar o seu sucesso profissional. É necessário criar um compartilhamento dessas atividades familiares e também adaptar o ambiente de trabalho para que seja mais amigável ao crescimento das mulheres. Hoje as chances não são iguais. É por isso que vemos mais homens nesses cargos. Novamente eu digo: precisamos atualizar o discurso. Não vamos mais falar sobre a mulher poder ou não poder assumir um cargo. Elas podem. A questão agora é como viabilizar a participação delas nessas posições de liderança.



RC: Qual a importância da OCB e seu trabalho de representação junto ao Congresso Nacional, ministros e presidente da República?

Tânia: A OCB foi criada para ser a voz das cooperativas brasileiras. Estamos sempre presentes, mostrando todos os benefícios que o cooperativismo é capaz de trazer para as pessoas e o país. Assim, nossa atuação junto aos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, com a imprensa e com organismos internacionais está focada na busca de conquistas e avanços para o setor. Nosso foco é levar o cooperativismo, suas necessidades e potencialidades em todos os ambientes. O modelo cooperativista merece essa representação e esse espaço. O trabalho não é simples, mas o comprometimento das nossas equipes é singular. Por isso, mesmo no contexto da pandemia, conseguimos obter tantas conquistas no ano passado.



RC: Quais foram as principais atividades e desafios da OCB em 2020, ano de pandemia?

Tânia: O ano de 2020 foi desafiador em todos os sentidos, tanto no aspecto sanitário, quanto no quesito econômico. Por isso, nesse contexto, a palavra de ordem foi adaptação. Apesar da nossa equipe de representação institucional estar trabalhando à distância, nunca estivemos tão perto das nossas cooperativas e das articulações com os Três Poderes. No Congresso Nacional acompanhamos um número recorde de proposições: 4.156, a maioria delas voltadas a mitigar os impactos da pandemia de Covid-19. No Executivo, tivemos um aumento de 45% nas reuniões com agentes públicos para debater demandas das cooperativas. Trabalhamos de maneira sistemática e estratégica para apoiar todos os sete ramos do cooperativismo. E temos conquistas relevantes para apresentar em cada um deles. Destaco que atuamos de forma firme para garantir o ato cooperativo nas discussões da Reforma Tributária; alteramos a Lei 5.764/71 para alterar os prazos assembleares e permitir a realização de AGOs virtuais; conseguimos incluir as cooperativas de crédito como operadoras do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe); batalhamos pela reversão da Cosit 11, que ameaçava com multas milionárias nossas cooperativas agroindustriais; e estivemos presentes em todas as negociações com o Ministério Público do Trabalho e o Ministério da Agricultura, sobre funcionamento de frigoríficos nesse período de pandemia. Isso apenas para citar algumas prioridades. Tudo que fizemos, para todos os ramos, está detalhado no nosso relatório de gestão disponível em nosso site (www.somoscooperativismo.coop.br).



RC: Quais as mudanças ocorridas no cooperativismo brasileiro e como define o momento atual deste sistema?

Tânia: Acredito que o cooperativismo vive, atualmente, o seu melhor momento em termos de consolidação. Veja: se, antes, já eram perceptíveis as mudanças que vinham ocorrendo no perfil do consumidor, agora, mais do que nunca, a decisão de consumir leva em consideração diversas variáveis que conversam com nosso modelo de negócio: produtos e serviços nacionais, que provêm de uma gestão democrática, participativa e transparente. Além disso, com a pandemia o setor também deu um salto em inovação. As cooperativas que ainda não estavam inovando perceberam que esse é um fator essencial para a sustentabilidade do nosso modelo de negócio. Em pesquisa realizada em 2021 pela OCB, levantamos que mais de 84% das cooperativas consideram a inovação como fundamental. Entendo que pensando e repensando nosso jeito de produzir ou prestar um serviço, com estratégia, inovação e, acima de tudo, considerando as pessoas como parte essencial de todos os processos, teremos condições de aproveitar as oportunidades que estão surgindo, mesmo antes do período que já chamamos de pós-pandemia.



RC: Como analisa a força do cooperativismo para o desenvolvimento de comunidades e do país?

Tânia: O cooperativismo tem essa capacidade de envolver as pessoas em torno de um objetivo em comum. Sempre foi e sempre será assim. Faz parte da essência das cooperativas atuar pelo bem-estar dos seus cooperados, empregados e comunidade. Então, quanto mais as pessoas conhecerem o cooperativismo, mais esse modelo de negócios vai poder transformar a realidade do nosso país. Quero destacar que as cooperativas funcionam como centros de inteligência e desenvolvimento para os cooperados, balizam os preços no mercado onde estão localizadas e são indutoras de crescimento em suas localidades. E fazem tudo isso cuidando das pessoas ao seu redor. Sobre esse último ponto, gostaria de trazer os números do Dia de Cooperar do ano passado. Mesmo com a pandemia, as cooperativas realizaram mais de duas mil ações que beneficiaram quase oito milhões de brasileiros. E vale destacar que 76% de tudo o que foi feito pelas cooperativas, por meio do Dia C, tiveram o objetivo de reduzir os impactos da Covid-19 em mais de mil municípios. Juntas, as cooperativas conseguem fazer muito pelo país.



RC: Considerando os princípios e propósitos do cooperativismo, a senhora acredita que se o Brasil fosse “cooperativista” poderia ser melhor?

Tânia: Não tenho dúvida. Embora tenha quase 200 anos, o cooperativismo, formatado com princípios e valores globais bem definidos continua atual. E digo mais, o cooperativismo é hoje o modelo econômico que melhor atende as necessidades do consumidor moderno. Eu acredito que quanto mais o Brasil for cooperativista, certamente seremos um país mais justo, feliz, equilibrado e com melhores oportunidades para todos, pois aí, sim, estaremos unidos por um propósito comum: a felicidade e o bem-estar coletivo da nação brasileira.



RC: Quais são fatores que determinam a excelência na gestão das cooperativas?

Tânia: A própria constituição das cooperativas, sua transparência, gestão participativa e suas regras já fazem delas um caso de sucesso. É claro que, apesar de termos leis, regimentos e outros normativos que balizam a nossa atuação, incluindo aí as assembleias gerais, os cooperados precisam buscar o aperfeiçoamento necessário para exercer as funções de gestão, fiscalização e controle. É por isso que o Sescoop é tão essencial na rotina das cooperativas. Ele é o nosso “S”, ou seja, é ele quem oferece as ações de desenvolvimento profissional tão essenciais para melhorar não só a gestão, mas diversos processos dentro das cooperativas. Vale a pena conferir os diversos cursos gratuitos que temos disponíveis. Basta acessar a plataforma www.capacita.coop.br/ sescoop e se qualificar à vontade.



RC: A senhora é vice-presidente do Instituto Pensar Agro. Quais são os objetivos desta entidade?

Tânia: O Instituto Pensar Agro (IPA), formado por 45 entidades do setor produtivo, é o braço técnico e informacional da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). Por meio de suas comissões temáticas e órgãos diretivos, o setor debate os principais desafios e oportunidades para o desenvolvimento sustentável das diferentes cadeias produtivas do agro. Estes pleitos são traduzidos em projetos, regulamentações, leis e políticas públicas de fomento ao setor. A OCB atua hoje de forma muito próxima com a Frente Parlamentar do Cooperativismo (Frencoop) e com a FPA para buscar uma maior presença do cooperativismo nas legislações e políticas públicas do Brasil.



RC: Como será o cooperativismo do futuro? Mais digital? Mais relacional?

Tânia: O cooperativismo do futuro já é uma realidade. Costumo dizer que a pandemia acelerou esse processo. As cooperativas que não estavam no mundo digital, por exemplo, tiveram que agilizar essa entrada. Do contrário, correm o risco de perder mercado e diminuir sua competitividade. Sobre isso, gostaria de falar as ações de estímulo à cultura da inovação que estamos realizando. A primeira delas é a nossa plataforma www.inova.coop.br, lançada em 2020. Lá é possível encontrar cases, cursos, ferramentas, livros digitais, além de matérias, entrevistas e diversos outros subsídios para inovação. A grande diferença do nosso material é que ele é todo voltado para as especificidades e necessidades do nosso setor. É a inovação na linguagem do cooperativismo! Recentemente, lançamos também as primeiras turmas do Programa de Formação de Agentes de Inovação, com representantes de cooperativas e de unidades do Sistema OCB que terão o papel de estimular a cultura e práticas inovadoras dentro do ecossistema cooperativista. Além disso, estamos preparando o lançamento do programa Conexão com Startups e Semana Coop de Inovação, ambos previstos para ocorrerem ainda em 2021. Nós temos visto ao longo da história humana que fora da inovação não há solução durável. E, nas cooperativas, essa busca constante pelo aperfeiçoamento de seus processos, produtos e serviços é algo que faz parte do DNA delas. É isso que assegura que as nossas cooperativas ampliem sua competitividade no mercado. Inovar é a resposta.



RC: Como avalia o cooperativismo praticado pela Coamo?

Tânia: A Coamo é inquestionavelmente uma potência. Como uma das maiores cooperativas da América Latina, é referência não apenas para cooperativas do agro. Muitas outras cooperativas de ramos diferentes se inspiram na Coamo para melhorar seus processos e produtos. A gestão de excelência, o cuidado com os cooperados e, ainda, todas as estratégias para manter o quadro social motivado nos enche de orgulho de fazermos parte de um movimento que já soma mais de 15 milhões de brasileiros.



RC: Deixe sua mensagem aos cooperados da Coamo e Credicoamo.

Tânia: Só me cabe agradecer pela oportunidade de poder falar aos cooperados e cooperadas da Coamo e da Credicoamo. Aproveito para parabenizar o amigo Aroldo Gallassini (Presidente do Conselho de Administração da Coamo e Credicoamo) que, durante tantos anos dedicou seu tempo e conhecimento para que o cooperativismo, por meio da Coamo, fosse conhecido e reconhecido. Também quero desejar muitas conquistas à equipe liderada pelo presidente executivo da Coamo, Airton Galinari, que está encarando o desafio de conduzir a cooperativa com uma nova forma de gestão. Por fim, coloco a OCB à disposição de toda a família Coamo, pois acredito que, juntos, podemos chegar ainda mais longe!

Tânia Zanella, gerente Geral da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB)
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