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Roberto Rodrigues
Referência no cooperativismo e agronegócio
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Roberto Rodrigues, ex-presidente da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) e Aliança Cooperativa Internacional (ACI), com mais de 40 anos no cooperativismo brasileiro é o entrevistado deste mês na Revista Coamo. Engenheiro agrônomo formado pela ESALQ/USP em 1965, doutor honoris causa da UNESP, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, ex-ministro da agricultura e embaixador especial para cooperativas na Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, Rodrigues tem uma trajetória vitoriosa como agricultor, empresário rural, professor, conferencista, conselheiro e presidente de várias entidades ligadas ao cooperativismo e agronegócio.
Para ele, o câmbio determinará se a margem será maior ou menor no agronegócio em 2016. As previsões indicam que até 2020 a oferta mundial de alimentos terá que crescer 20% e para que isto aconteça o Brasil terá que ampliar sua produção em 40%. Segundo o cooperativista, são questões cruciais e impeditivas para o avanço do agronegócio - logística, política de renda, seguro rural, preços mínimos, crédito e questão comercial.
REVISTA COAMO: Como o Senhor se define?
Roberto Rodrigues: Sabe que nunca me perguntaram isso? Posso dizer que sou um brasileiro otimista e esperançoso, que fez da agricultura a sua religião. Para explicar isso, conto-lhes um fato – um dia fui assistir com minha mulher o filme do Rei Charles, que era um apaixonado pela música. E a sua mulher disse para ele, Rei Charles: você gosta muito mais da música do que qualquer outra coisa. Chegando em casa, minha mulher me fez a mesma pergunta: você gosta mais de mim ou da agricultura? Então para mim, a agricultura é mais do que uma religião, sou cristão e acredito em Deus. O agricultor é o parceiro de Deus, pois a vida é uma dádiva. Deus nos deu a vida e quem permite que ela siga em frente é o agricultor, que produz comida, fibras, alimentos e energia. A vida continua e o agricultor consegue fazer com que esta dádiva siga adiante. O nosso agricultor é fantástico, ele tem a melhor tecnologia tropical do mundo para produzir.
RC: Que legado o Senhor quer deixar com tantos anos de vivência no cooperativismo?
Rodrigues: Já combinei com meus netos e filhos, que um dia eles falem que eu fui um sujeito que tentou ser justo. Acredito que a justiça é o mais importante dos valores. Por muitos anos carreguei esta dúvida na minha vida: qual o caminho para ser feliz, o amor ou justiça? E confesso que, pendulando ao longo da minha vida, afirmo que a justiça é mais importante, já que o amor pode se transformar em uma pessoa injusta. A justiça é um grande bem. A vida é uma viagem, imagine um trem correndo em dois trilhos, um é o amor e o outro é a justiça, e o combustível do trem é a esperança para se chegar a uma estação melhor, e o cooperativismo é um excelente caminho para isso.
RC: O agronegócio vem tendo uma grande parcela para o superávit da balança comercial brasileira. Como o senhor vê o impacto do setor frente ao cenário econômico atual?
Rodrigues: Esta é uma verdade absoluta e os dados oficiais do ano passado consolidam esta afirmação. O setor foi o único que teve incremento, todos os outros caíram, e assim foram os números do setor quanto ao saldo comercial, ao PIB. O agronegócio vem sustentando a economia e a área social do nosso Brasil. O país está sofrendo com esta crise implantada pelo governo, o ajuste fiscal implicou em algumas características. Primeiro, o crédito ficou menor e mais caro, os custos do crédito subiram, assim como preços dos insumos, em função da questão cambial, aumentaram também a energia, o diesel, e a inflação, portanto os custos tiveram um significativo aumento. Ainda na região Norte, aconteceram problemas climáticos em função da falta de chuva e produtores tiveram perdas nas colheitas e margens menores na atividade. O câmbio determinará se a margem será maior ou menor no agronegócio, que é volátil e difícil apontar para uma expectativa a médio prazo. Não se consegue prever o que vai acontecer de forma consistente. Por isso, tudo indica que teremos um ano difícil com custos elevados, margens mais curtas e a definição da renda dar-se-á pela questão cambial. O mundo continuará tendo demanda por alimentos e devemos nos preparar para um horizonte de dificuldades em 2016.
RC: O Senhor acredita em uma mudança de cenário a médio prazo?
Rodrigues: Indiscutivelmente, sou um otimista por natureza. As previsões indicam que até 2020 a oferta mundial de alimentos terá que crescer 20%, e para que isto aconteça o Brasil terá que ampliar sua produção em 40%, já que a União Europeia deve crescer 4% e os EUA 12%. O Brasil recebe uma pressão muito grande, de fora para dentro para produzir mais e colaborar para o aumento de alimentos no mundo.
RC: A logística é um dos principais gargalos para o desenvolvimento do setor produtivo, como o Senhor vê esta questão e a solução deste problema?
Rodrigues: O Brasil tem um plano de logística preparado no ano passado pela presidente Dilma. No papel é uma beleza, mas para se tornar realidade depende de parceria público-privada. O setor privado não investe porque não tem confiança no governo. Enquanto não houver um outro cenário político que gere confiança, a logística continuará ficando as “Kalendas” – Kalendas é uma expressão latina que indica algo que jamais ocorrerá.
RC: Quais são os pontos centrais que impedem o desenvolvimento do setor produtivo?
Rodrigues: Considero três questões cruciais, uma é a logística, outros são a política de renda que ainda não temos e o seguro rural que é uma coisa triste em nível nacional. Tem também os preços mínimos que não são calculados de acordo com a lei, o crédito que é antigo e precisa ser reformado, e a questão comercial, já que o Brasil perdeu o protagonismo que tinha perante várias comunidades do exterior.
RC: O Senhor andou pelo mundo, foi presidente da OCB e ACI, conhece o cooperativismo como poucos. Como avalia este movimento no momento?
Rodrigues: O cooperativismo é sempre uma resposta perfeita quando se tem crise, já mostrou em vários momentos a sua importância e no caso brasileiro, está evidente por meio das cooperativas agrícolas. O Brasil é um país múltiplo e o cooperativismo depende muito claramente da sua realidade local. É comprovado, onde existe o espírito associativista e o empreendedorismo, o cooperativismo vai para a frente, diferente da situação onde é o governo que faz tudo. Temos cooperativas e regiões primorosas e consistentes, sendo bons exemplos no cooperativismo.
RC: Como avalia o cooperativismo paranaense?
Rodrigues: O Estado do Paraná é empreendedor por natureza em face de uma colonização múltipla com várias raças e culturas, e isso permitiu um híbrido fantástico. O cooperativismo paranaense é muito competente, e neste cenário a Coamo é um modelo reconhecido não só no Brasil como também no exterior. Ela tem a capacidade de cumprir a doutrina do sistema, que é corrigir o social pelo econômico, o seu associado evolui na escala social e isto é a magia do cooperativismo que a Coamo faz muito bem.
RC: Qual sua mensagem aos associados da Coamo?
Rodrigues: Uma mensagem de confiança e otimismo. O Brasil será o campeão mundial da alimentação e, portanto, será o campeão mundial da paz. Isto está escrito nas estrelas. É um determinismo histórico e irrecorrível, por isso temos que trabalhar muito e confiar muito, fazer a nossa parte e esquecer do governo, porque nem sempre ele é amigo, mas sim adversário. Vamos dar ao cooperativismo o espaço que ele merece e deve ter no cenário brasileiro
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