O engenheiro civil e produtor rural Renato Nobile sempre fez do cooperativismo uma prática de vida. Desde muito jovem, observou na cooperação a melhor forma para se obter resultados que beneficiem o maior número de pessoas à sua volta. Por isso, em 1988 foi referendado como novo associado da Cooperativa Agroindustrial de Cândido Mota (Coopermota), cidade localizada no Sudoeste paulista, e cuja constituição contou com seu avô materno entre os 20 cafeicultores que a fundaram, em 1959, um ano antes do seu nascimento.
Entre os anos de 1993 e 1998, ocupou diversas funções no Conselho de Administração da cooperativa. Foi presidente do Centro de Desenvolvimento da Região do Vale do Paranapanema, formado por cooperativas da região, e vice-presidente do Comitê de Bacias Hidrográficas do Médio Paranapanema. Entre os anos de 2007 e 2008, foi assessor de Relações da Organização das Cooperativas do Estado de São Paulo (Ocesp).
Graças à sua história na Coopermota e na Ocesp, foi convidado pelo presidente Márcio Lopes de Freitas, em 2008, a assumir o cargo de secretário-executivo da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), posição ocupada até 2010. No exercício deste cargo, participou ativamente da consolidação dessa instituição – entidade máxima de representação institucional do movimento cooperativista do país.
Em 2011, com o objetivo de fortalecer a imagem e o desenvolvimento sustentável do cooperativismo brasileiro, contribuiu ativamente para a ressignificação do Sistema OCB. Desde então, é o responsável pelas atividades e funções da Superintendência do Sistema OCB.
Revista Coamo: Qual é a sua missão principal dentro da OCB?
Renato Nobile: Contribuir com a construção de um ambiente cada vez mais propício ao desenvolvimento sustentável das cooperativas. Para isso, temos trabalhado para uma interlocução eficiente com os integrantes dos Três Poderes. Além disso, queremos que todos os cooperados do país sintam orgulho de fazer parte de um movimento econômico que valoriza as pessoas sem fazer nenhuma distinção entre elas. E por falar em pessoas, é necessário que a sociedade conheça os produtos e serviços oferecidos pelas cooperativas. Por isso, lançamos há quase três anos o Movimento Somoscoop, estimulando as cooperativas a aderirem ao carimbo Coop, para ajudar a sociedade a identificar os produtos e serviços do cooperativismo brasileiro. Sabemos que o perfil do consumidor está mudando e temos a certeza de que muito daquilo que esse cliente quer, as cooperativas podem oferecer.
RC: Como observa o cooperativismo brasileiro em 2019?
Nobile: O país está se recuperando, ainda, de uma crise política e de seus reflexos econômicos. Isso é fato! Não temos outra opção a não ser crescer. Como vamos fazer isso? Investindo na qualificação profissional dos cooperados, dos dirigentes, na divulgação da qualidade dos nossos diferenciais. Além disso, precisamos continuar focados nos desafios e, especialmente, nas oportunidades que vão surgir ao longo do caminho. O cooperativismo gera em todos os cooperados a confiança num amanhã melhor. É por isso que não paramos de trabalhar. A pluralidade de ideias, opiniões e visões nos torna fortes – e diferentes dos demais modelos econômicos – afinal de contas, um dos nossos princípios é a gestão democrática. E é, também, graças a essa característica que conseguimos, ao longo dos últimos anos, antever as crises e ajustar nossos processos.
RC: Quais os avanços percebidos nos últimos dez anos do cooperativismo brasileiro?
Nobile: As cooperativas estão sendo muito mais bem percebidas pelos governos. Como somos uma reunião de pessoas com o mesmo objetivo e nossa atuação é balizada por valores e princípios internacionais, estamos entre as melhores ferramentas de desenvolvimento socioeconômico. Nossa eficiência já foi comprovada até por organismos internacionais como é o caso da ONU. Além disso, graças à atuação da nossa Frente Parlamentar do Cooperativismo (Frencoop), podemos dizer que os marco regulatórios estão entre as principais conquistas da última década, especialmente porque a pauta da Frencoop é feita com base nas necessidades da base, trazidas até nós por meio das nossas Unidades Estaduais e dos conselhos consultivos de cada ramo. Nos últimos anos, também, fomos protagonistas na formulação de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento de todo o setor produtivo brasileiro, como no caso do novo Código Florestal, da adequação das condições de renegociação de dívidas do Funrural, da continuidade dos programas de compras públicas da agricultura familiar e de diversos planos agrícolas e pecuários, que reconheceram a importância das cooperativas na política agrícola. Cabe lembrar, também, a recente aprovação da Lei Complementar nº 161/2018, que reconhece o papel do cooperativismo financeiro para o desenvolvimento regional do país, ao permitir que as cooperativas de crédito realizem a captação de recursos de prefeituras e outros entes públicos municipais. Consideramos que essas são vitórias do bom senso e do trabalho cooperativo entre cooperativas de crédito, OCB e Frencoop, buscando sempre o equilíbrio entre os diversos atores interessados nos temas em discussão. É importante frisar que todos os frutos do trabalho realizado por cooperativas, unidades da OCB e parlamentares, ao longo da última década, têm uma mesma raiz: transformar o mundo num lugar mais justo, feliz e equilibrado.
RC: Qual a projeção do cooperativismo brasileiro para os próximos dez anos?
Nobile: É difícil fazer uma previsão dessas, considerando um universo muito grande de variáveis. O que podemos dizer é que o Sistema OCB vai continuar atuando em prol da construção de um cenário cada vez mais propício para o desenvolvimento das cooperativas do país. Nosso desejo para daqui a dez anos é o de sermos o modelo econômico mais valorizado pelos brasileiros, tanto aqueles que já conhecem uma cooperativa, quanto aqueles que ainda não sabem que a cooperação pode – e vai – mudar o mundo! E, como podemos sonhar, queremos ser porta-vozes de mais boas notícias para o país. Recentemente lançamos o Anuário do Cooperativismo Brasileiro e mostramos o quanto contribuímos com a solidez do nosso PIB. No que diz respeito ao ativo total e ao ingresso e receitas brutas, por exemplo, nossas cooperativas também fizeram bonito. Elas registram, respectivamente, R$ 351,4 bi e R$ 259,9 bi entre os anos de 2014/2018. Para ter uma ideia, as cooperativas recolheram aos cofres públicos R$ 7 bilhões, em impostos e tributos, apenas em 2018. Também fizemos a economia girar no ano passado, ao injetarmos mais de R$ 9 bilhões, apenas com o pagamento de salários e outros benefícios destinados a colaboradores das cooperativas. Um cooperativismo forte é sinônimo de uma economia forte.
RC: Quais os principais desafios enfrentados a frente do cooperativismo?
Nobile: O movimento cooperativista tem diante de si desafios estruturais, tais como o reconhecimento do adequado tratamento tributário do ato cooperativo. Essa, sem dúvida, é uma das grandes questões que demandam muito esforço. Tanto é que o assunto está na nossa Agenda Institucional há vários anos, como uma das prioridades. Estamos acompanhando as ações que tramitam no STF e seguimos sensibilizando o governo, por meio das agências reguladoras, atuando, inclusive nas propostas da Reforma Tributária, atualmente em trâmite no Congresso Nacional, no intuito de preservar tal reconhecimento. Além disso, temos o compromisso com as cooperativas que é o de colocar em prática todas aquelas diretrizes elaboradas durante o 14º Congresso Brasileiro do Cooperativismo.
RC: Se o Brasil fosse uma cooperativa, acredita que o país seria melhor?
Nobile: Não tenho dúvidas disso! As cooperativas dentro e fora do país seguem princípios e valores universais, independentemente de onde estejam. Valores que têm tudo a ver com o desejo da geração atual que, cada dia mais, demanda uma participação nas decisões, devido ao alto grau de consciência e da responsabilidade que assumem diante de suas escolhas na hora de consumir um produto ou serviço. Para essa geração, quanto menor o impacto negativo social, econômico e ambiental, melhor. O mundo mudou e, sem dúvida, é mais cooperativo do que nunca! Então, as cooperativas têm tudo para sobressair nesse mercado atual, se estiverem atentas às novas possibilidades e oportunidades que certamente estão surgindo.
RC: Qual é a missão dos cooperados dentro das suas atividades para o êxito no sistema? E o papel dos funcionários na gestão e na propagação do cooperativismo?
Nobile: A atuação ética, sempre focada no coletivo, é um dos grandes diferenciais do trabalho de um cooperado e, também, dos colaboradores das cooperativas. O cooperativismo nasce quando pessoas comuns, com um mesmo ideal, decidem trabalhar, coletivamente, convergindo suas forças, possibilidades e vontades. Embora tenhamos leis que regulam as atividades das cooperativas, respeitar esses dispositivos, cuidando das pessoas e dos recursos naturais é um comportamento que nos levará muito mais longe. É essencial destacar ainda a participação dos cooperados nas atividades estatutárias e sociais, afinal de contas, esse sentimento de pertencimento, aliado à consequente fidelização do associado, são um dos grandes fatores de desenvolvimento da cooperativa.
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Renato Nobile, superintendente do Sistema OCB |
RC: Como está o processo de governança e a gestão dos dirigentes cooperativistas frentes aos desafios de administração?
Nobile: Um grande destaque é a aplicação dos recursos que compõem o Sescoop e são destinados a ferramentas, programas e processos de capacitação e melhorias na gestão das cooperativas e nos modelos de governança. A própria Coamo dá um grande exemplo de atualização na governança, ao realizar, agora em 2019, uma mudança estatutária, estabelecendo uma diretoria profissional e fortalecendo o Conselho que é o grande elo entre os cooperados e os executivos.
RC: Como analisa o movimento SomosCoop?
Nobile: O Movimento SomosCoop é uma grande conquista para o cooperativismo brasileiro. Surgiu da necessidade de nos fazermos conhecer pela sociedade, além disso, ele também tem como objetivo mostrar aos cooperados que fazem parte de um grande movimento de pessoas preocupadas em melhorar a realidade do país, a partir da própria realidade. A ideia é mostrar a opção com o DNA Coop! Todas as vezes que alguém escolhe algo de uma cooperativa, escolhe viver em harmonia com as dezenas de famílias que atuaram por aquela entrega. Além de respeitarmos os recursos naturais, nós atuamos para recuperar e reparar os impactos gerados e, também, em preservar o meio ambiente.
RC: A Coamo está completando 49 anos e a Credicoamo 30 anos. Qual a sua visão do trabalho dessas cooperativas?
Nobile: A Coamo e a Credicoamo são, sem dúvida alguma, exemplos de que muito esforço, gestão, flexibilidade, dedicação pelo que se faz e, sobretudo, profissionalismo e comprometimento com a causa de seus cooperados, são elementos que pavimentam a estrada do sucesso. Alcançar a marca de 49 e 30 anos, respectivamente, é um feito importante não só para o cooperativismo, mas para a economia nacional, sobretudo num contexto em que o país ainda colhe os frutos da turbulência política e seus reflexos no mercado e na vida das pessoas. É esse jeito de trabalhar, focado nas pessoas, na dimensão local, no aperfeiçoamento das práticas gerenciais, na boa governança e numa gestão de qualidade que faz das duas cooperativas um grande exemplo a ser seguido. Parabéns a todos que trabalham para nutrir as famílias do país, não só com grãos e proteína vegetal e animal, mas com a certeza de que, juntos, podemos ir muito mais longe, fazendo do nosso país uma nação mais justa, equilibrada e com melhores oportunidades para todos. Por fim, fica a nossa admiração e respeito ao engenheiro agrônomo José Aroldo Gallassini, toda a diretoria, conselhos e demais executivos tanto da Coamo quanto da Credicoamo, pela construção de um legado exemplar ao cooperativismo não só do Brasil, mas do mundo. Agradecemos, por fim, às duas cooperativas por “emprestarem” muitos dos seus executivos para comporem, com a Ocepar e com o nosso time de Brasília, os diversos grupos de trabalho que atuam na defesa dos interesses comuns a todos as cooperativas do país.
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