Coamo Agroindustrial Cooperativa | Edição 533 | Março de 2023 | Campo Mourão - Paraná

ENTREVISTA

MARCELO AUGUSTO BATISTA

“Brasil é grande potência mundial e referência na produção agropecuária sustentável.”

Durante muito tempo, o solo só era considerado bom se tivesse boas características naturalmente. Mas com o passar dos anos, a ciência, por meio de conceitos químicos, físicos, físico-químicos e biológicos, desenvolveu formas de tornar solos inférteis em solos férteis, principalmente pela correção da acidez do solo. A afirmação é do engenheiro agrônomo, pesquisador e doutor em Agronomia pela Universidade Estadual de Maringá (UEM), Marcelo Augusto Batista. Segundo ele, o Brasil é uma grande potência na produção agropecuária, sendo o quarto produtor mundial de grãos e maior exportador de grãos. “Além da produção de grãos, o Brasil tem relevância mundial na produção de cana- -de-açúcar, citros e carnes (bovino, aves e suínos). O grande diferencial em relação aos grandes produtores mundiais é que o Brasil exporta grande fatia da produção, enquanto os grandes países produzem para uso doméstico.”

Revista Coamo: Qual a importância do solo para a atividade agropecuária?

Marcelo Batista: O solo é um recurso natural muito lentamente renovável e fundamental para a produção agropecuária. Ele é o substrato que tem várias funções, dentre elas o fornecimento de nutrientes, água, ar e sustentação para o desenvolvimento das plantas. Dependendo da relação e características do solo estas darão suporte para uma maior ou menor produção agropecuária, sendo considerado, no sentido amplo, como solos férteis ou inférteis. Durante muito tempo, o solo só era considerado bom se tivesse boas características naturalmente. Com o passar dos anos, a ciência, por meio de conceitos químicos, físicos, físico-químicos e biológicos, desenvolveu formas de tornar solos inférteis em solos férteis, principalmente pela correção da acidez do solo, da adubação mineral, orgânica ou verde e irrigação. O uso de máquinas para a boa distribuição e incorporação (quando necessário) de fertilizantes e corretivos, permitiu a atuação rápida e em áreas extensas.

RC: O Brasil é uma das principais potências agrícolas do mundo. E qual é o papel dos agricultores na produção sustentável e preservação do meio ambiente produtivo?

Marcelo Batista: O Brasil é de fato, uma potência no quesito produção agropecuária. Tomando como exemplo a produção de grãos, o Brasil é o quarto produtor mundial de grãos (1º EUA, 2º China e 3º Índia), o segundo maior exportador de grãos (atrás apenas dos EUA) e é o maior exportador em valor de grãos do mundo. Além da produção de grãos, o Brasil tem relevância mundial na produção de cana-de-açúcar (maior produtor do mundo), citros (maior produtor do mundo) e carnes (bovino, aves e suínos). O grande diferencial em relação aos grandes produtores mundiais de cada um destes itens é que o Brasil exporta grande fatia da produção, enquanto os demais grandes produtores (países superpopulosos como China e Índia) produzem para uso doméstico e mesmo assim sendo deficitário nessa balança. Outro grande diferencial da produção agropecuária brasileira se deve a produção seguindo regras ambientais e de forma conservacionista. O sistema de plantio direto, as reservas legais, matas ciliares e descarte correto de embalagens são exemplos março/2023 revista 11 Marcelo Augusto Batista é engenheiro agrônomo e doutor em Agronomia pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Professor de Fertilidade do Solo (graduação) e de Adubos e Adubação (pós-graduação). Orientador de mestrado e doutorado no Programa de Pós-Graduação em Agronomia (Capes 6). Pesquisador Nível 2 do CNPq. Palestrante na área de manejo da adubação de soja, milho e trigo. Autor de livro, capítulo de livro e mais de 50 artigos científicos. desta produção agropecuária sustentável. Sempre podemos melhorar e as universidades, empresas de pesquisas, cooperativas, extensão e a sociedade como um todo tem trabalhado por essa melhora e tem fiscalizado para que isso aconteça. Apesar de se ter o “senso comum” de que o Brasil é um país que tem o meio ambiente degradado pela agricultura, deve-se informar aos mal-informados e aos oportunistas que dos 66,3% do território nacional de áreas destinadas à vegetação protegida e preservada (equivalente a 43 países e 5 territórios da Europa), 25,6% são áreas destinadas a preservação da vegetação no mundo rural, ou seja, estão dentro de propriedades rurais.

Marcelo Augusto Batista é engenheiro agrônomo e doutor em Agronomia pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Professor de Fertilidade do Solo (graduação) e de Adubos e Adubação (pós-graduação). Orientador de mestrado e doutorado no Programa de Pós-Graduação em Agronomia (Capes 6). Pesquisador Nível 2 do CNPq. Palestrante na área de manejo da adubação de soja, milho e trigo. Autor de livro, capítulo de livro e mais de 50 artigos científicos.

O SISTEMA DE PLANTIO DIRETO, AS RESERVAS LEGAIS, MATAS CILIARES E DESCARTE CORRETO DE EMBALAGENS SÃO EXEMPLOS DE UMA PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL."

RC: O senhor defende que não é só conservar o solo, mas melhorá-lo para que ele seja mais produtivo?

Marcelo Batista: A qualidade química do solo é uma meta a ser perseguida pelos produtores e engenheiros agrônomos. Uma vez atingida essa qualidade química do solo deve ser mantida. Desta forma, solos que apresentam indicadores de qualidade química do solo ruim devem ser melhorados pelo uso das técnicas comprovadas disponíveis para tal. Quando já se tem adequada qualidade química dos atributos do solo deve-se trabalhar para mantê-las. Do ponto de vista químico, esta melhora e manutenção das qualidades químicas do solo passam pelo uso de fertilizantes, corretivos e condicionares do solo.

RC: Quais produtores vêm obtendo produtividades e renda satisfatória a cada nova safra?

Marcelo Batista: Os produtores que têm realizado manejo adequado do solo colhem bons frutos do seu trabalho. De forma geral, a média de produtividade de muitas culturas tem aumentado ao longo do tempo devido ao uso de técnicas adequadas de cultivo. A produtividade média da soja a nível nacional passou de 1.740 kg ha- na safra 1.989/90 para aproximadamente 3.479 kg ha na safra 2.022/23 (CONAB, 2023), aumento de aproximadamente 200% em 33 anos. O diagnóstico é de que melhorar o solo para aumentar a produtividade é tão importante como o uso dos insumos para essas correções. Para isso, o primeiro diagnóstico deve ser por meio das produtividades médias das lavouras cultivadas, associada a uma boa amostragem, análise e interpretação da análise do solo, finalizando com uma boa recomendação de fertilizantes, corretivos e condicionadores do solo. Se o produtor seguir estes passos e tendo uma boa assistência técnica, ele poderá investir seus recursos nos insumos que realmente o solo de sua propriedade precisa.

RC: Como está o uso das tecnologias pelos produtores para aumento da capacidade produtiva do solo?

Marcelo Batista: Os solos brasileiros, de forma geral, apresentam reação ácida, ou seja, apresentam o pH baixo. Quando o pH do solo está baixo uma série de problemas são observados, como: a) toxidez de alumínio, b) baixa disponibilidade de nitrogênio, fósforo, potássio, cálcio, magnésio, enxofre, boro e molibdênio, c) alta disponibilidade de ferro, cobre, manganês e zinco, d) toxidez de manganês, em casos extremos, e) baixa eficiência das adubações e inoculações, f) alta fixação de fósforo etc. O calcário é um produto derivado da moagem de rochas calcárias. Esse produto pode aumentar o pH do solo e corrigir todos os problemas causados pela acidez do solo. O uso de calcário para fins de correção da acidez do solo é chamado de calagem. Quando usado de forma técnica, este insumo melhora as qualidades químicas do solo e pode aumentar a produtividade das lavouras. Porém, a frequência de uso do calcário e as doses praticadas têm sido abaixo das necessárias ou muitas vezes sem nenhum critério técnico. A escolha da dose, do tipo (dolomítico, calcítico ou magnesiano), forma de aplicação (com ou sem incorporação) e da época vai definir o sucesso dessa operação. Porém, cada caso é um caso! A determinação de todos os critérios para a aplicação do calcário depende dos resultados obtidos na análise de solo, das qualidades do calcário e do sistema de manejo adotado. Considerando os principais atributos do solo alterados pela calagem, um solo adequado para a produção de soja, milho e/ou trigo deve ter na camada de 0-20 cm pHCaCl2 entre 5,0 e 5,9, alumínio menor que 1,5 cmolc dm-3 (ideal zero), cálcio maior que 2,0 cmolc dm-3, magnésio maior que 1,0 cmolc dm-3, saturação por bases (V%) entre 61 a 89% e saturação por alumínio (m%) menor que 20% (ideal zero).

Marcelo Augusto Batista em evento na Fazenda Experimental da Coamo

RC: Como analisa os resultados do Programa de Correção de Solo da Coamo?

Marcelo Batista: É louvável a iniciativa da Coamo em criar um programa exclusivo e voltado a correção do solo. Isso mostrar o caráter técnico típico da Coamo que sempre norteou as decisões administrativas da cooperativa. Tenho certeza de que nesse programa a conservação do solo e os produtores serão os grandes vencedores.


RC: Vivemos a agricultura 5.0. O que deve ser feito para melhores resultados, considerando o potencial produtivo e o uso das tecnologias atuais?

Marcelo Batista: Todas as tecnologias disponíveis são importantes para a melhoria das condições de produção. Essas tecnologias podem ajudar de várias formas como aumentando a eficiência de operações, diminuindo custos, diminuindo o tempo de operações, por exemplo. Por exemplo, o uso da agricultura de precisão pode fazer com que a distribuição do calcário nos talhões de uma propriedade rural seja mais inteligente variando a dose conforme a necessidade de cada local.

RC: Como tem percebido a visão dos agricultores jovens na conservação e correção do solo? Eles valorizam o que seus pais e avós fizeram em décadas anteriores?

Marcelo Batista: É sempre muito bom ver os filhos acompanhando os pais e dando sequência ao negócio da família. Ainda não sei dizer como será em sucessão familiar em relação aos cuidados com o solo de forma geral. Na minha opinião, duas situações muito contrastantes podem acontecer. A primeira é de que a próxima geração, devido ter mais acesso e acesso rápido as informações tenha mais cuidado do que as gerações anteriores e consigamos manter todos os avanços nessa área e até mesmo progredir. A segunda hipótese seria de que a nova geração, por não terem vivido o flagelo da erosão do solo, não entenda a necessidade de práticas conservacionistas, principalmente o terraceamento e o sistema de plantio direto. Eu acredito mais na primeira opção.

"A próxima geração, devido ao acesso e informações, poderá ter mais cuidado do que as gerações anteriores e esperamos que sejam mantidos os avanços nessa área e até mesmo avançar."

RC: Como percebe o trabalho da Coamo no sentido de promover o uso da tecnologia como forma sustentável as atividades dos cooperados?

Marcelo Batista: Sempre é muito bom quando empresas sérias se preocupam com a manutenção das pessoas no campo pela garantia de renda delas. Isso fica mais interessante quando isso ocorre com preocupação social e ambiental. A sustentabilidade depende de várias vertentes, ambiental, social e financeira. Quando isso é fomentado de forma séria o sucesso é garantido.

RC: Qual a importância desta relação entre pesquisador e cooperado para a elevação das produtividades e conservação do solo?

Marcelo Batista: A pesquisa em diferentes níveis é importante, mas no caso da agricultura, a mesma tem que ser difundida para o máximo de pessoas possível. A organização dos dias de campo é uma excelente forma de difundir essas informações adequadas para o cultivo e para as boas práticas de manejo. Poder colocar em contato os produtores e os extensionistas com os especialistas é muito bom pois desmistifica muitas dúvidas deles. Já para o pesquisador é uma excelente oportunidade para receber as demandas e entender os problemas que afligem técnicos e produtores e procurar as soluções.

RC: Qual é na sua opinião o valor da parceria das instituições com as cooperativas, e no caso, com a Coamo?

Marcelo Batista: Especificamente a parceria da Coamo com a Universidade Estadual de Maringá tem sido muito importante, pois tem proporcionado testar várias ideias em diferentes áreas como na fertilidade do solo, adubos e adubação, nutrição de plantas, manejo físico do solo, doenças de plantas, plantas daninhas e, até mesmo na área de sensoriamento remoto, inteligência artificial, georreferenciamento etc. Ou seja, para nós é muito bom poder realizar pesquisas em uma superestrutura (superlaboratório) que é a Fazenda Experimental da Coamo. Geralmente, o retorno vem na forma de informação de qualidade que vai até a cooperativa, extensionistas e produtores.

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