Coamo Agroindustrial Cooperativa | Edição 512 | Abril de 2021 | Campo Mourão - Paraná

ENTREVISTA

HAROLD ESPÍNOLA Chefe do Departamento de Supervisão de Cooperativas e de Instituições Não Bancárias (Desuc) - Banco Central do Brasil

Harold Paquete Espínola Filho é servidor do Banco Central do Brasil, atua na área de Fiscalização do BCB há 23 anos e é chefe do Departamento de Supervisão de Cooperativas e de Instituições Não Bancárias (Desuc). Foi chefe de Gabinete do Diretor de Fiscalização, chefe do atual Departamento de Gestão Estratégica, Integração e Suporte da Fiscalização (Degef), chefe adjunto e consultor do atual Departamento de Monitoramento do Sistema Financeiro (Desig), supervisor de fiscalização no Desuc e no atual Departamento de Supervisão Bancária (Desup), supervisor de equipe especializada em tesouraria no Desup e inspetor. É graduado em Engenharia e pós-graduado em Administração.

Harold Espínola, chefe do Departamento de Supervisão de Cooperativas e de Instituições Não Bancárias (Desuc), do Banco Central, é o entrevistado do mês na Revista Coamo. De acordo com ele, o cooperativismo de crédito brasileiro tem se desenvolvido de forma forte e consistente nos últimos anos. "O segmento tem reconhecida importância e, por isso mesmo, compõe uma das dimensões da agenda estratégica do Banco Central, inserida no pilar Inclusão da Agenda BC#", diz.

Segundo ele, o momento atual é de revolução tecnológica, transformação digital acelerada, mudança de hábitos dos consumidores de produtos financeiros e surgimento de novos participantes e novos modelos de negócio. "Temos uma regulação que fomenta o desenvolvimento da competição e o desenvolvimento do mercado. Estamos vivenciando o Pix e o Open Banking. Mas, as cooperativas vêm crescendo muito ao longo de sua história, em especial nos últimos anos, mesmo em cenários adversos", assegura.



Revista Coamo: Como o senhor analisa o cooperativismo de crédito brasileiro na atualidade e sua importância para cooperados e o país?

Harold Espínola: O cooperativismo de crédito brasileiro tem se desenvolvido de forma forte e consistente nos últimos anos, expandindo o número de cooperados e apresentando um crescimento contínuo e ascendente em ativos, em especial da carteira de crédito e depósitos. Mas, para bem além dos seus próprios números, o cooperativismo de crédito contribui inegavelmente para o desenvolvimento econômico das regiões onde está presente. As cooperativas por essência têm uma forte atuação local, fazem parte das comunidades, levam disponibilidade de serviços financeiros, muitas vezes em locais em que as entidades tradicionais não estão presentes, e aumentam a capilaridade da rede de atendimento do sistema financeiro. Com isso, promovem a cidadania financeira, sem dúvida, mas também muito contribuem com a concorrência e, consequentemente, com a prática de melhores condições de preços e serviços. Isso favorece diretamente seus associados, mas, indiretamente, a sociedade a seu redor – seus resultados permanecem em circulação no próprio local, gerando mais desenvolvimento. É um ciclo que se retroalimenta positivamente. O segmento tem reconhecida importância e, por isso mesmo, compõe uma das dimensões da agenda estratégica do Banco Central, inserida no pilar Inclusão da Agenda BC#.



RC: Quais são as perspectivas de crescimento do cooperativismo de crédito?

Espínola: Estamos em tempos de revolução tecnológica, transformação digital acelerada, mudança de hábitos dos consumidores de produtos financeiros e surgimento de novos participantes e novos modelos de negócio. Temos uma regulação que fomenta o desenvolvimento da competição e o desenvolvimento do mercado. Estamos vivenciando o Pix e o Open Banking. Mas, as cooperativas vêm crescendo muito ao longo de sua história, em especial nos últimos anos, mesmo em cenários adversos. Assim, entendo que todo esse ambiente, para além de desafiante, é bem mais um conjunto de oportunidades – as cooperativas conhecem de perto o seu cooperado e podem aproveitar muito a ocasião. Dentro do próprio quadro social há ainda muito espaço para ser explorado na alavancagem de negócios.



RC: O Banco Central lançou vários desafios de crescimento ao cooperativismo de crédito. Na sua visão, as cooperativas estão respondendo a esses desafios?

Espínola: As propostas no âmbito da Agenda BC# Inclusão - Cooperativismo estão estruturadas ao redor de três grandes eixos: fomento aos negócios; aprimoramento da governança; e aperfeiçoamento da organização sistêmica para aumento da eficiência do Sistema Nacional de Crédito Cooperativo (SNCC) – todos esses movimentos apoiados pelo Banco Central e voltados a impulsionar o crescimento do setor. Como contrapartida, foram negociadas algumas metas desafiadoras para as cooperativas, mas, também, totalmente alinhadas aos objetivos e a dimensões da Agenda, como #Inclusão, #Competitividade, #Educação. Sim, as cooperativas vêm evoluindo positivamente em relação às metas, mas, digamos que ainda há muito trabalho a fazer na busca do seu atingimento. Recentemente, para fomento da reflexão, pedimos que o próprio segmento nos apresente a avaliação do seu desempenho, por intermédio do Conselho Consultivo Nacional do Ramo Crédito da OCB (Ceco) – o que deve acontecer em breve. Também, temos expectativa que a atualização do marco legal do cooperativismo, por meio do PLP nº 27/2020 (atualização da Lei Complementar nº 130), em tramitação no Congresso, contribua para acelerar a dinâmica de todo esse processo.



RC: As cooperativas impulsionam o crescimento e o desenvolvimento das comunidades onde atuam. Como percebe esta situação, considerando que os recursos gerados por elas ficam nas próprias regiões?

Espínola: De fato, as cooperativas têm uma forte atuação local, principalmente no interior, e é daí que vem a sua força essencial. Mais do que estarem muito próximas das sociedades locais e de estarem nelas inseridas, em seu dia a dia, elas pertencem a essas sociedades. Essa relação intrínseca traz grande sinergia e proximidade entre as atividades das cooperativas e as necessidades específicas da comunidade – geram, ainda, um sentimento de pertencimento. Por definição, as sociedades cooperativas não visam o lucro, por isso podem oferecer serviços financeiros a valores mais acessíveis, o que fomenta o crescimento econômico. Além disso, o resultado financeiro de suas atividades, as sobras, é rateado entre os cooperados, aumentando a renda. Isso permanece no local e acaba sendo reaplicado na economia da região e na própria cooperativa, criando um ciclo ascendente e retroalimentado – que traz benefícios para além do quadro de cooperados, ou seja, para toda a sociedade onde está presente o cooperativismo.



RC:Como analisa os volumes de recursos disponibilizados pelas cooperativas de crédito aos seus associados para o fomento de suas operações?

Espínola: Hoje, as cooperativas podem oferecer praticamente todos os tipos de serviços financeiros a seus cooperados, especialmente se considerarmos a possibilidade de distribuir produtos de outras entidades pertencentes ao SNCC, indo, portanto, muito além da oferta de empréstimos e de financiamentos. Ao longo dos últimos anos, a carteira de crédito das cooperativas cresceu constante e recorrentemente em níveis bem superiores à média do sistema financeiro, mesmo durante as crises financeiras ocorridas. Por suas especificidades na captação e na oferta de recursos (capta e empresta dentro de grupos delimitados, seus associados), o crédito no SNCC costuma ter um comportamento diferente do conjunto do restante da economia, podendo desempenhar um papel anticíclico – suportando e atendendo as necessidades de seus cooperados e, por consequência, ajudando a preservar suas atividades. Isso é o que estamos novamente observando no momento atual. Vale destacar que as cooperativas de crédito têm espaço para crescer ainda muito mais a sua carteira de crédito, uma vez que os depósitos têm crescido em velocidade maior do que as concessões de empréstimos e financiamentos.



RC: Como deve ser a participação dos cooperados em suas cooperativas e qual a sua responsabilidade na sociedade cooperativista?

Espínola: A participação do cooperado é fundamental. Não podemos nos esquecer que o segundo princípio cooperativista é a gestão democrática, o que quer dizer que os cooperados podem (e devem!) participar ativamente na formulação das políticas, na tomada de decisões e no acompanhamento das atividades da sua cooperativa. Há dois caminhos básicos para isso: a participação regular nas assembleias, ordinárias e extraordinárias, e a escolha consciente de seus dirigentes eleitos. Também, os recursos tecnológicos hoje existentes em muito facilitam a divulgação de informações, permitindo, até a realização das assembleias de forma remota ou mista (presencial + remota). Essa é a grande responsabilidade dos cooperados e é por conta desse mutualismo que o cooperativismo consegue entregar valor não só a seus membros, mas também à comunidade.



RC: O cooperativismo é um agente de desenvolvimento no país. Se e o Brasil fosse uma “cooperativa”, ele seria melhor, mais justo e fraterno?

Espínola: As cooperativas, por sua natureza, pela sua atuação e pelos princípios que as regem, contribuem muito para as comunidades onde estão inseridas e, consequentemente, para o desenvolvimento regional e do país. Entregam produtos financeiros em melhores condições de preços e, também, na forma mais adequada à necessidade de cada local. Mas, além disso, levam inclusão e cidadania financeira, favorecendo a evolução do associado na gestão de sua vida financeira. Também, promovem ações sociais e de ajuda. Tudo isso traz crescimento e melhores condições para o seu quadro social, bem como para a comunidade em seu entorno. Assim, elas já promovem uma sociedade melhor.



RC: O senhor tem reiterado que a comunicação é primordial e um dos grandes desafios na atualidade, em um mundo cada vez mais digital. Na sua opinião, como está a comunicação no cooperativismo e o que pode ser melhorado?

Espínola: A comunicação efetiva sempre foi um desafio, mas, também, um enorme diferencial para aqueles que conseguem vencer esse obstáculo. O mundo atual só colocou um (grande) aditivo nisso: as informações fluem instantaneamente e atingem uma quantidade enorme de pessoas simultaneamente. Ou seja, o erro, o lapso ou a inadequação no que se pretende dizer alcança proporções inimagináveis há pouco tempo. Por outro lado, as oportunidades são enormes para aqueles que, efetivamente, “se comunicarem”. Mas, voltando ao cerne da pergunta, o cooperativismo ainda é pouco entendido fora das suas próprias fronteiras. Há um espaço enorme para ser explorado.



RC: Que outros desafios o senhor vislumbra para o cooperativismo de crédito?

Espínola: Para continuar a sua trajetória em um sistema financeiro altamente tecnológico e com muitas novas instituições oferecendo novos produtos e serviços, as cooperativas de crédito devem entender cada vez mais as expectativas de seus cooperados e prestar os melhores e mais adequados serviços ao seu quadro social. Tudo isso, sem perder a sua essência: a cooperativa é do cooperado, é também, a sua casa. O relacionamento próximo e o sentimento de pertencimento são diferenciais a serem preservados e fomentados. Colocar tudo isso junto, com agilidade e flexibilidade, é o desafio.



RC: Como observa a interação e o relacionamento da Coamo e da Credicoamo com o Banco Central, e suas atuações no cooperativismo brasileiro?

Espínola: O conjunto Coamo/Credicoamo é tradicional no ambiente do cooperativismo, uma referência – sua história e seus números falam por si só. O conjunto tem uma participação preponderante no agronegócio e, consequentemente, na economia dos estados onde atua fortemente e, também, do país. Seu relacionamento é profissional, ético e proativo.



RC: Deixe sua mensagem para os diretores e cooperados da Coamo e da Credicoamo.

Espínola: Bem, primeiramente gostaria de enaltecer a história e a relevância da Coamo e da Credicoamo. Estamos todos inseridos em um momento de transformação dos negócios, em especial da maneira de fazê- -los. A diferença para o que já vivemos é a velocidade em que as coisas acontecem e evoluem, permitidas e aceleradas cada vez mais pela tecnologia, em todos os campos. Os conglomerados estão cada vez mais focados em atender o consumidor na maior parte possível de suas necessidades – querem ser enxergados como provedores de soluções. O conjunto Coamo/ Credicoamo já tem isso em seu DNA, pois fornece muitas soluções para a vida de seus cooperados. Mas, mesmo celebrando sucesso, com justo merecimento, é tempo de aguçar a flexibilidade, o entendimento dos desafios e a capacidade de se transformar continuamente.

Harold Espínola, chefe do Departamento de Supervisão de Cooperativas e de Instituições Não Bancárias (Desuc)
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