Coamo Agroindustrial Cooperativa | Edição 540 | Outubro de 2023 | Campo Mourão - Paraná

ENTREVISTA

SILVIA MASSRUHÁ

Presidente Embrapa

"A Embrapa é grande impulsionadora da agropecuária brasileira. De importador passamos a exportador e somos referência para o mundo."

A pesquisadora Sênior da Embrapa Informática Agropecuária que passou a se chamar Embrapa Agricultura Digital a partir de setembro de 2021, Silvia Massruhá, é a entrevistada desta edição da Revista Coamo. Ela assumiu este ano a presidência da Embrapa, sendo a primeira mulher na história a ocupar o cargo. Tem doutorado em Computação Aplicada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e mestrado na área de Automação pela Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação da Unicamp. “A minha vida toda trabalhei com a área de Tecnologia da Informação e estou há 34 anos na instituição. Trabalhei minha vida toda com essa qualidade de tecnologia, e vi como a tecnologia poderia ajudar a resolver e encontrar soluções para a pecuária brasileira”, conta a pesquisadora, defendendo que as tecnologias digitais têm um papel importante para ajudar os produtores com a inclusão digital na fronteira do conhecimento para o Brasil continuar como protagonista na agricultura brasileira.

Revista Coamo: A Embrapa completou 50 anos e pela primeira vez elegeu uma mulher para o ocupar o mais alto cargo da instituição. Como foi isso para a senhora? Foi surpresa ou já era algo previsto? 

Silvia Massruhá: Obrigada por esta oportunidade de me comunicar com os cooperados da Coamo. Para mim, foi uma surpresa, mas estou há 34 anos na Embrapa, sou pesquisadora de carreira e nos últimos 15 anos estive na direção da Embrapa Agricultura Digital, que fica em Campinas (SP), com muitos anos de pesquisa e, até 2022, quando acabou o meu mandato. Estava retomando um projeto de pesquisa como pesquisadora de carreira e veio o convite neste ano para assumir a presidência da Embrapa. Eu aceitei e fico muito honrada em ser a primeira mulher na frente da presidência da Embrapa. 

RC: É uma grande responsabilidade ser presidente da Embrapa? 

Silvia: Sim, vi o que é a responsabilidade de presidir uma empresa de 50 anos. Desse período vivi 2/3 da minha vida na Embrapa, e fico mais honrada ainda por ver que foi um processo de meritocracia, buscando dentro de setores da Embrapa quem já tinha experiência na empresa e de carreira técnica. 


RC: Como a Embrapa pode impulsionar a inclusão digital no campo? 


Silvia: A Embrapa tem 50 anos e tem legados, e é uma grande impulsionadora do agro e da pecuária brasileira. Há 50 anos a gente importava alimentos e, hoje, somos grandes produtores e exportadores de alimentos para o mundo. Somos protagonistas na agricultura mundial e referência em agricultura tropical. Dentro dos nossos propósitos, temos a questão da sustentabilidade e de, cada vez mais, produzir alimentos saudáveis, com bases sustentáveis do ponto de vista ambiental, econômico e social.

RC: Nesses 50 anos houve muitas mudanças? 

 

Silvia: Sim e temos que acompanhar a evolução, por isso, temos que ter uma nova visão. Tínhamos a ideia de aumentar a produção de alimentos e aumentamos em 40% a área plantada em 50 anos e a produção e a produtividade em 580%. Isto mostra o quanto a nossa agropecuária é sustentável. Aprendemos a produzir mais na mesma área, e temos de duas a três safras por ano. É algo que só o Brasil tem.

Silvia Massruhá é pesquisadora Sênior da Embrapa Informática Agropecuária que passou a chamar Embrapa Agricultura Digital a partir de setembro de 2021. Com doutorado em Computação Aplicada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e mestrado na área de Automação pela Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação da Unicamp, com aproximadamente 100 publicações técnicocientíficas e 25 softwares. Chefe-geral da Embrapa Agricultura Digital (2022-2015) e Chefe de P&D (2015-2009). Tem formação complementar em desenvolvimento de habilidades gerenciais pela Fundação Dom Cabral e em gestão avançada pela Amana-Key. Tem articulado projetos e parcerias nas áreas de IoT Rural, Inteligência artificial, Bigdata e Analytics e participado do movimento de Agtechs atuando em programas de aceleração e mentoria de startups visando contribuir para a consolidação do ecossistema de inovação para Agricultura Digital no país."
“A IDEIA É DESENVOLVER OS PILARES PESQUISA E INOVAÇÃO, CONECTIVIDADE E PARTICIPAÇÃO."

RC: Como entram as tecnologias digitais neste trabalho da Embrapa? 

Silvia: Avançamos muito e vocês devem acompanhar esse tempo todo, porque temos as entregas meteorológicas no campo, plantadeiras e colheitadeiras com GPS, temos mais satélites em diferentes evoluções, drones monitorando lavouras, e tudo isso tem gerado dados e informações, com métricas acertadas para a nossa agricultura. Precisamos usar essas novas tecnologias, como por exemplo, a inteligência artificial, o blockchain - mecanismo de banco de dados avançado que permite o compartilhamento transparente de informações na rede de uma empresa e a internet das coisas. E por que temos que usar isso? Não porque seja moda, mas essas tecnologias permitem trazer transparência, fazer os cálculos e mostrar como a agricultura sustentável gera rentabilidade no ambiental, no econômico e no social. Então temos que usar, cada vez mais, essas tecnologias. 


RC: A senhora tem falado na bioeconomia. Do que se trata? 


Silvia: Outro desafio é trazer e fortalecer as ações de bioeconomia. Quando falamos isso, exploramos mais a nossa biodiversidade. A Amazônia é um local que a ainda precisamos trabalhar para melhorar e trazer a inclusão produtiva dos pequenos produtores que trabalham com sistemas agroflorestais no Norte e Nordeste do país. É o pequeno e o médio produtor que estão lá concentrando a maior parte dos produtores rurais. Temos que fortalecer essas ações também nos outros biomas brasileiros. Para isso, temos que avançar, além de automação, de precisão digital, na área de biotecnologia, na tecnologia e estar sempre na fronteira do conhecimento para o Brasil e continuar como protagonista na agricultura brasileira. 

RC: Como deve ser a inclusão digital no campo? 


Silvia: No Brasil, temos cinco milhões de produtores rurais e apenas 10% são considerados grandes. Vocês que trabalham em cooperativa sabem bem disso, onde cerca de 90% são pequenos e médios produtores. Assim, as tecnologias digitais têm um papel importante para ajudá-los. Pensando nisso, a Embrapa lançou o “Projeto Semear”, aprovado em novembro de 2022, que iniciamos há dois meses e visa criar distritos tecnológicos no Brasil, sendo cinco no Estado de São Paulo e os outros em diferentes regiões do país, para promover a inclusão digital do pequeno e médio produtor. A ideia é trabalhar justamente com as cooperativas, associações de produtores dos pequenos e médios, levantando as necessidades deles, e desenvolver três pilares, nas áreas de pesquisa e inovação, na conectividade e na capacitação.


RC: Esses pilares podem mudar a realidade dos agricultores? 


Silvia: A partir da pesquisa e inovação, podemos fazer um diagnóstico e levantar quais são as necessidades para melhorar a gestão e a comercialização. Um outro pilar é a conectividade e temos gente trabalhando e levantando essa questão com modelos diferentes e sistemas híbridos, com banda larga, rede wi-fi , via rádio ou via satélite, com redes de baixa frequência. Então podemos desenhar vários modelos conforme a região, a cultura.

Silvia Massruhá, presidente da Embrapa

 "O campo avançou muito e precisamos incluir novas tecnologias, também, para o pequeno e médio produtor."

RC: Qual a importância do terceiro pilar? 

Silvia: O terceiro pilar é a capacitação e a gente percebe que se não tiver um trabalho nessa área fica difícil para o pequeno e médio produtor entender como a tecnologia pode agregar valor ao sistema de produção, desde reduzir custos ou melhorar a gestão, o próprio sistema em si, e até mesmo buscar um selo de sustentabilidade. Se você tem rastreabilidade, pode trazer esse selo. Então, esse é um projeto que a Embrapa tem e vai explorar várias dessas tecnologias como a inteligência artificial, visão computacional, internet das coisas e tecnologias, rastreabilidade. Vamos trabalhar com vários modelos de conectividade, para que a tecnologia digital chegue no campo. Vamos criar dez distritos tecnológicos. 

RC: Como define o agronegócio brasileiro dentro dessa realidade? 


Silvia: A agropecuária brasileira que envolve cinco milhões de produtores rurais, é ávida por novas tecnologias. Eles são empreendedores e sempre acreditaram na inserção de novas tecnologias dentro do sistema de produção. É esse protagonismo que nos trouxe até aqui. Por isso, cada vez mais, vemos uma nova demanda no mundo todo para uma agricultura sustentável e de rastreabilidade, e a necessidade de conseguirmos certificações para contribuir na exportação de produtos, e isso passa pelo uso das tecnologias. 


RC: Como tem sido a parceria da Coamo com a Embrapa? 


Silvia: Tem sido essencial nesses 50 anos de pesquisa da Embrapa. Os produtores trazem as necessidades para a pesquisa, os problemas que estão enfrentando no campo. É esse diálogo com a cooperativa e os cooperados, que ajudam a Embrapa a validar novos cultivares e trazer novas tendências.

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